Fernando Pimentel, diretor de Comércio Exterior do Itamaraty, durante evento da Amcham em São Paulo (Divulgação)
Repórter de macroeconomia
Publicado em 26 de novembro de 2025 às 06h01.
Embora o tarifaço dos Estados Unidos contra produtos brasileiros tenha sido reduzido, o governo brasileiro segue preocupado com outra questão: a investigação aberta pelos americanos contra o Brasil, por meio da Seção 301.
"Esta é possivelmente a maior 301 de todos os tempos. Muitas vezes, uma ação de 301 em um setor bem específico, mesmo quando se fala de China. O Brasil é alvo de uma investigação amplíssima. São seis temas, cada um deles é extremamente amplo", disse Fernando Pimentel, diretor do Departamento de Política Comercial do Ministério das Relações Exteriores.
A investigação, aberta em julho, envolve seis áreas em que o Brasil é acusado de práticas desleais. São elas: comércio digital e serviços de pagamento eletrônico, incluindo o Pix; tarifas preferenciais; aplicação de leis anticorrupção; propriedade intelectual; mercado de etanol e desmatamento ilegal.
Pimentel falou sobre a situação durante o Encontro Empresarial BR-US 2025, realizado pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham), na terça-feira, 25. Ele disse também que o Brasil tem menos controle sobre os possíveis resultados da investigação.
"O fato de a gente responder bem e ter vários dados e fatos do nosso lado não quer dizer que a 301 vai se decidir em nosso favor. Há muita discricionalidade na negociação", afirmou.
"É importante, além do tarifaço, a gente buscar encaminhar também a 301. Não faz sentido a gente resolver o tarifaço e ter de enfrentar a 301 três meses depois. Possivelmente, pelo escopo, a gente pode ter tudo isso de novo. Precisa evitar uma situação muito complicada", disse.
A investigação foi aberta em julho. Em setembro, houve uma audiência pública, na qual membros do governo, de entidades e empresas puderam apresentar seus argumentos contra e a favor das tarifas. Na ocasião, várias companhias dos EUA fizeram argumentos contra as tarifas do Brasil.
"A parte de apresentação e resposta já foi concluída. Tem agora uma fase das consultas. Elas foram oferecidas, o Brasil aceitou, mas aí cabe ao governo americano marcar. Estamos esperando para que as consultas ocorram", disse Pimentel.
A investigação não tem prazo para ser concluída, mas a expectativa é que o processo chegue ao final nos próximos meses.
A seção 301 é parte da Lei do Comércio dos EUA, de 1974. Essa lei autoriza o presidente a tomar medidas contra países que violem regras internacionais de comércio ou tome medidas para restringir os negócios com os Estados Unidos.
As investigações contra os países que podem ter descumprido regras são iniciadas pelo escritório do Representante Comercial dos EUA (USTR), ligado à Presidência.
A regra determina que o USTR negocie com os países para que eles retirem as barreiras comerciais antes de aplicar medidas punitivas.
Caso não haja acordo, o governo americano pode levar a questão para órgãos internacionais, como a Organização Mundial do Comércio, ou impor sanções unilaterais contra o país.
Em 2001, por exemplo, a Ucrânia foi alvo de medidas por não respeitar direitos autorais em CDs de música.
Em 2018, a China foi alvo de uma investigação por desrespeitar propriedades intelectuais. Como resultado, o país recebeu tarifas mais altas em uma série de produtos, o que deu início à guerra comercial entre EUA e China.
Em 1989, o Brasil foi alvo de uma investigação pela seção 301 feita pelos EUA. Na época, os americanos questionaram o país por proibir a importação de mais de 1.000 itens, incluindo laticínios, plásticos, eletrônicos e motores de carros.
O Brasil dizia que as cotas eram necessárias para preservar seu balanço de pagamentos com o exterior e que agia dentro das regras do Gatt, grupo que coordenava o comércio global antes da criação da Organização Mundial do Comércio.
A situação levou cerca de dois anos para ser resolvida, de forma diplomática. Os EUA não chegaram a aplicar medidas duras contra o Brasil na época.