Mundo

Por que o crescimento do PIB da Argentina despencou em 2025?

Analistas esperavam alta de 5% para este ano, mas crise cambial e problemas na política complicam o cenário

Javier Milei, presidente da Argentina, canta durante show de rock, em Buenos Aires (Luis Robayo/AFP)

Javier Milei, presidente da Argentina, canta durante show de rock, em Buenos Aires (Luis Robayo/AFP)

Rafael Balago
Rafael Balago

Repórter de macroeconomia

Publicado em 8 de outubro de 2025 às 06h01.

A Argentina começou o ano de 2025 com boas perspectivas econômicas. O governo de Javier Milei defendia que 2024 foi  um ano de ajuste duro, que levou a um encolhimento do PIB, de 1,7%, mas em 2025 as coisas iriam melhorar e o crescimento seria de 5%.

Nos últimos meses, no entanto, as coisas mudaram. O PIB do segundo trimestre da Argentina teve retração de 0,1%. Assim, em julho, o crescimento anual caiu para 2,9%.

Nesta terça-feira, 7, o Banco Mundial revisou a previsão de crescimento da Argentina de 5,5% para 4,6. A entidade fez elogios ao país, mas com ponderações.

"A Argentina continua apresentando uma recuperação econômica notável após dois anos consecutivos de contração, embora desafios profundos ainda persistam", afirmou o estudo do Banco Mundial.

O banco diz ainda que os sinais iniciais de melhora no consumo privado e no investimento também são visíveis e que eles são consequência do plano de estabilização do governo Milei, que baixou a inflação e gerou superávit fiscal.

Na segunda, 6, a edição mais recente do Relatório de Expectativas do Mercado (REM), publicado pelo banco central argentino, apontou que a expectativa média do mercado local é de crescimento de 3,9% em 2025.

O REM aponta ainda que há expectativa de que a inflação termine 2025 a uma taxa anual de 29,8%. Em agosto, último dado disponível, a inflação em 12 meses fechou em 33,6%. Ou seja: apesar da crise, a alta de preços parece controlada, ao menos por enquanto.

Razões da piora

Os motivos para a má fase atual da economia são vários. No campo político, Milei teve uma derrota de seu partido, A Liberdade Avança, nas eleições locais de Buenos Aires, no começo de setembro, e viu seu governo envolvido em escândalos de corrupção. Isso elevou o risco de uma derrota maior do governo nas eleições legislativas de 26 de outubro, onde haverá renovação do Congresso.

Na economia, o governo Milei cometeu falhas ao mudar o regime de câmbio, que saiu do modelo fixo para a flutuação dentro de bandas, a partir de abril. No entanto, em setembro, o dólar subiu muito, bateu no teto da banda e só voltou ao patamar desejado pelo governo após os Estados Unidos prometerem apoio.

Na tarde desta quarta-feira, o dólar oficial era vendido a 1.460 pesos, dentro da banda, que é móvel. Até o final de outubro, o teto deverá ser de US$ 1.496.

"Toda a crise que houve na atividade econômica tem a ver com o câmbio e as pressões que houve em julho e agosto, antes das eleições na província de Buenos Aires", diz Juan Carranza, analista político da consultoria Aurora Macro Strategies.

"O governo usou uma ferramenta para conter o câmbio que não deu certo. As taxas [de juros] subiram muito e isso parou a atividade econômica", diz o analista.

Carranza explica que a alta das taxas do governo fez os bancos colocarem mais dinheiro em títulos públicos, o que reduziu o crédito ao setor privado, o que freou a atividade.

Ao mesmo tempo, o governo argentino passou a fazer grandes vendas de dólares para manter o peso dentro da banda. Em setembro, no auge da crise, foram vendidos mais de US$ 1 bilhão em três dias.

A situação cambial teve melhora no final de setembro, depois que os Estados Unidos prometeram dar mais apoio, e dinheiro, para a Argentina. Além disso, o governo Milei reduziu impostos sobre as exportações do setor agrícola, que vale até 31 de outubro. Com isso, produtores trouxeram mais dólares ao país.

O prazo da medida, 31 de outubro, é próximo ao da data da eleição na Argentina, em 26 de outubro, o que aumentará a oferta de dólares, mesmo às custas de queda na arrecadação. Uma das prioridades de Milei é manter as contas públicas sob controle, para ajudar a conter a inflação, que depende também do câmbio sob controle. Uma disparada do dólar geraria efeitos nos preços e colocaria em risco todo o seu plano de estabilização.

Expectativa pela eleição e apoio dos EUA

Assim, o país espera com atenção pelas eleições de outubro, que definirão se Milei terá novo fôlego para aprovar mais medidas de seu plano ou se terá dois anos de mandato sem força no Congresso, enquanto acompanha de perto os indicadores econômicos.

"Creio que vamos ter, neste terceiro trimestre, uma atividade econômica parada na Argentina, e o PIB vai ser menor do que se pensava", diz Carranza.

O analista aponta ainda que o crescimento econômico do país se dá de forma desigual, com mais avanços nos setores agrícola, mineração e energia. Já a indústria e trabalhos informais não se recuperaram do tombo em 2024.

"Isso ajuda a explicar a derrota de Milei na província de Buenos Aires, onde se depende muito dos serviços e da atividade industrial", afirma.

Além da disputa eleitoral, os argentinos estão de olho nos Estados Unidos. O governo Trump prometeu enviar mais ajuda, mas até agora não formalizou as medidas. Milei irá aos Estados Unidos novamente na semana que vem, para a reunião geral do Fundo Monetário Internacional, e deverá ser recebido por Trump no dia 14.

A derrota nas urnas no fim do mês poderá colocar em risco também o apoio dos EUA, avalia Carranza. "Não creio que o governo de Trump, conhecendo Trump, apoie fortemente um presidente que perca uma eleição e fique muito debilitado. 'Sem espaço para perdedores', me parece", diz.

Acompanhe tudo sobre:ArgentinaJavier MileiInflação

Mais de Mundo

Presidente do Equador sai ileso de tiroteio contra sua caravana, afirma ministra

Leoa de estimação de influenciador ataca e hospitaliza duas pessoas na Tailândia

Tempestade no Everest deixa mais de mil pessoas presas em acampamentos; 200 esperam resgate

Leão XIV visitará Turquia e Líbano em primeira viagem ao exterior como papa