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Senadores dos EUA alertam Trump sobre custos da tarifa ao Brasil e apontam 'abuso de poder'

Senadores expressam preocupação com a tentativa de interferir no sistema judicial brasileiro e suas consequências econômicas para os EUA

Publicado em 25 de julho de 2025 às 11h50.

Última atualização em 25 de julho de 2025 às 11h57.

Senadores dos Estados Unidos, em uma carta divulgada nesta sexta-feira, 25, liderada pelos parlamentares democratas Jeanne Shaheen e Tim Kaine, expressaram preocupações sobre a ameaça do presidente Donald Trump de iniciar uma guerra comercial com o Brasil. A medida, que inclui a imposição de tarifas de 50% sobre todos os produtos importados do país, foi considerada pelos senadores como um abuso de poder, já que Trump citou a investigação contra o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro como um dos motivos para isso (leia a íntegra).

Na carta, os senadores destacam que a economia dos Estados Unidos depende fortemente do comércio com o Brasil, responsável por mais de US$ 40 bilhões em importações de produtos americanos anuais. Entre eles, está o café, cuja importação dos EUA gira em torno de US$ 2 bilhões por ano. O comércio bilateral entre países também sustenta cerca de 130 mil empregos nos Estados Unidos, tornando a relação comercial crucial para o bem-estar econômico do país, de acordo com os senadores.

"Escrevemos para expressar preocupações significativas sobre o claro abuso de poder inerente à sua recente ameaça de iniciar uma guerra comercial com o Brasil. Os Estados Unidos e o Brasil têm questões comerciais legítimas que devem ser discutidas e negociadas", diz trecho da carta, assinada por outros 9 membros do Senado norte-americano.

Uma guerra comercial com o Brasil, portanto, causaria um aumento dos custos para as famílias e empresas americanas, apontam os senadores. Os parlamentares alertam que o Brasil já afirmou que tomará medidas retaliatórias, e Trump também se comprometeu a retaliar similarmente. Isso significa que os exportadores dos EUA sofreriam, com o aumento de impostos sobre os produtos importados e o impacto nos preços para os consumidores americanos, além das tarifas que podem ultrapassar os 50% inicialmente previstos.

A abordagem de usar a ameaça de tarifas comerciais para interferir no sistema judicial de outro país é vista pelos senadores dos EUA como um "abuso de poder", prejudicando as relações diplomáticas e comerciais entre as nações.

No documento, eles argumentam que isso representa uma tentativa de Trump de utilizar o poder econômico dos EUA para ajudar um amigo, o ex-presidente Bolsonaro, o que colocaria em risco a credibilidade do país em questões internacionais e poderia desestabilizar a relação com o Brasil.

Interferência no Brasil

Outro ponto central da carta dos senadores é a tentativa de interferir no sistema jurídico de uma nação soberana. O uso da pressão econômica para influenciar a decisão do sistema judicial do Brasil é considerado pelos senadores como um precedente perigoso, que pode enfraquecer a posição dos EUA em questões internacionais e prejudicar o respeito pelo Estado de Direito.

Ao buscar a proteção de Bolsonaro por meio de medidas econômicas, Trump estaria não apenas prejudicando o Brasil, mas também arriscando criar um precedente de interferência nos sistemas legais de outros países, segundo os senadores, o que pode gerar reações negativas em outros governos ao redor do mundo.

Os parlamentares também alertam que uma guerra comercial com o Brasil pode afastar o país dos Estados Unidos e aproximá-lo da China. A China já tem investido significativamente no Brasil, especialmente em infraestrutura, com projetos em andamento em portos e ferrovias, e está expandindo sua presença econômica na América Latina.

O movimento, de acordo com a carta, poderia ser ampliado se o Brasil se sentir pressionado a distanciar-se dos Estados Unidos. Com isso, a China aumentaria sua influência na região, especialmente no momento em que os EUA estão tentando conter essa crescente presença chinesa na América Latina.

A carta também menciona que as ações de Trump podem prejudicar os esforços mais amplos dos Estados Unidos na região, como o combate à influência da China. A China já está muito presente na América Latina através de seu Belt and Road Initiative, um projeto que visa expandir sua rede de infraestrutura e investimentos em vários países da região.

O apoio a um sistema democrático, a promoção de eleições livres e justas e o fortalecimento de relações econômicas mutuamente benéficas devem ser prioridades na política externa dos EUA, conforme afirmado pelos senadores.

Os senadores concluem que o governo dos EUA "deveria focar na promoção de relações comerciais estáveis e transparentes, e não usar sua força econômica para fazer valer interesses pessoais em detrimento das relações diplomáticas e comerciais internacionais".

Leia a carta na íntegra:

Caro Presidente Trump,

Escrevemos para expressar preocupações significativas sobre o claro abuso de poder inerente à sua recente ameaça de iniciar uma guerra comercial com o Brasil. Os Estados Unidos e o Brasil têm questões comerciais legítimas que devem ser discutidas e negociadas. No entanto, a ameaça de tarifas do seu governo claramente não está voltada para isso. Também não se trata de um déficit comercial bilateral, já que os EUA tiveram um superávit comercial de bens com o Brasil de US$ 7,4 bilhões em 2024, e não registram um déficit comercial com o Brasil desde 2007.

Ao contrário – como o senhor afirma explicitamente em sua carta ao presidente brasileiro Lula da Silva – a ameaça de impor tarifas de 50% sobre todas as importações do Brasil e de ordenar ao Representante Comercial dos EUA que inicie uma investigação sob a Seção 301 da Lei de Comércio de 1974, tem como objetivo principal forçar o sistema judicial independente do Brasil a interromper a acusação do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro. Interferir no sistema legal de uma nação soberana estabelece um precedente perigoso, provoca uma guerra comercial desnecessária e coloca os cidadãos e empresas americanas em risco de retaliação.

O Sr. Bolsonaro é um nacional brasileiro que está sendo processado nos tribunais do Brasil por alegadas ações sob a jurisdição daquele país. Ele é acusado de trabalhar para minar os resultados de uma eleição democrática no Brasil e de planejar um golpe de Estado. Usar todo o peso da economia americana para interferir nesses processos em nome de um amigo é um uso indevido de poder, enfraquece a influência dos Estados Unidos no Brasil e pode prejudicar nossos interesses mais amplos na região. O anúncio de sua administração, em 18 de julho de 2025, sobre sanções de visto contra os juízes brasileiros que trabalham no caso do Sr. Bolsonaro indica, mais uma vez, a disposição de sua administração em priorizar sua agenda pessoal em detrimento dos interesses do povo americano.

Suas ações aumentariam os custos para as famílias e empresas americanas. Os americanos importam mais de US$ 40 bilhões anualmente do Brasil, incluindo quase US$ 2 bilhões em café. O comércio entre os EUA e o Brasil sustenta cerca de 130.000 empregos nos Estados Unidos, que estão sendo colocados em risco pelas ameaças de tarifas elevadas. O Brasil também prometeu retaliar, e o senhor já se comprometeu a retaliar de forma semelhante – o que significa que os exportadores dos EUA sofrerão e os impostos sobre as importações para os americanos aumentarão além do nível de 50% que foi ameaçado.

Uma guerra comercial com o Brasil também ajudará a aproximar o Brasil da República Popular da China (RPC) em um momento em que os EUA precisam conter agressivamente a influência da RPC na América Latina. Empresas estatais e conectadas ao estado chinês estão investindo pesadamente no Brasil, incluindo múltiplos projetos de portos em andamento, e recentemente o China State Railway Group firmou um Memorando de Entendimento (MOU) para estudar um projeto ferroviário transcontinental.

Essas considerações não são exclusivas ao Brasil. Em toda a América Latina, a RPC está trabalhando para ampliar sua influência por meio de sua Iniciativa do Cinturão e Rota. Estamos preocupados que suas ações para minar um sistema judicial independente apenas aumentem o ceticismo quanto à influência americana na região e proporcionem aos oficiais da RPC e às empresas estatais respaldo em sua agenda. A mesma tendência também está ocorrendo no Sudeste Asiático e no Leste Asiático.

Os objetivos principais dos EUA na América Latina devem ser melhorar as relações econômicas mutuamente benéficas, promover eleições democráticas livres e justas e conter a influência da RPC. Instamos o senhor a reconsiderar suas ações e priorizar os interesses econômicos dos americanos que desejam previsibilidade, e não mais uma guerra comercial.

Atenciosamente,

[Assinaturas dos senadores]

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