Negócios

Com R$ 300, maranhense cria fábrica de biscoitos e fatura R$ 220 mil por ano

Ana Luzia Alhadeff transformou uma solução caseira para a filha na Doce Pedaço Biscoitos Finos, que hoje exporta para o México e negocia entrada em Portugal

Ana Luzia Alhadeff, fundadora da Doce Pedaço Biscoitos Finos: “Em alguns momentos achei que não daria certo, mas nunca desisti”

Ana Luzia Alhadeff, fundadora da Doce Pedaço Biscoitos Finos: “Em alguns momentos achei que não daria certo, mas nunca desisti”

Caroline Marino
Caroline Marino

Jornalista especializada em carreira, RH e negócios

Publicado em 11 de julho de 2025 às 13h53.

Última atualização em 11 de julho de 2025 às 18h29.

A maranhense Ana Luzia Frazão Alhadeff, formada em História e ex-docente da rede pública e de faculdades particulares, viu a vida mudar com o nascimento da segunda filha, diagnosticada com paralisia cerebral. Ela abandonou o mestrado, a carreira e qualquer outro plano para cuidar de Sofia – que também possui intolerância à lactose –, em tempo integral. Na busca por alimentos que a menina pudesse consumir, encontrou na cozinha uma forma de cuidado e um novo caminho. Por sugestão da gastropediatra, fez os primeiros biscoitos sem lactose, usando maracujá por conta da acidez. Sofia adorou e chamou de “doce”.

Nascia ali, sem que soubesse, a base da Doce Pedaço Biscoitos Finos, que hoje produz cerca de 10 toneladas do produto por ano e avança no processo de internacionalização. A marca já exporta para o México e está em negociação com Portugal. Em 2025, a perspectiva é faturar cerca de R$ 220 mil, 20% acima do ano passado.

Como reflexo do trabalho, foi duas vezes destaque no Prêmio Sebrae Mulher de Negócios. Em 2023, ficou em segundo lugar na categoria Empresa de Pequeno Porte e, no ano passado, venceu a etapa estadual na categoria Negócios Internacionais.

Interesse espontâneo e capacitação desde o início

O que começou como um “aconchego de mãe”, como diz Ana, ganhou forma de projeto comercial quase por acaso. Em uma festa da escola da filha, preparou uma versão tradicional da receita – sem as restrições – e enviou junto com os biscoitos de Sofia. Um dos pacotes acabou nas mãos de uma rede de joalherias, que encomendou os produtos. Em pouco tempo, mais pedidos chegaram.

Atenta às possibilidades e determinada a fazer tudo corretamente desde o começo, procurou o Sebrae e formalizou a empresa como MEI em 2015. A instituição tornou-se uma parceira constante na jornada, com capacitações e orientações. Com essa base e apenas R$ 300, uma bacia plástica,  uma colher de pau e um forno, iniciou a operação.

Da casa da mãe ao varejo maranhense

Com o aumento da demanda, adaptou duas salas na casa da mãe – uma para montar a cozinha industrial e outra para o estoque. A Doce Pedaço passou a atender também redes de supermercados locais, como o Grupo Amasp. Para isso, investiu na profissionalização da embalagem e da apresentação dos produtos com apoio do Sebraetec, programa de consultorias em design, marketing e rotulagem para pequenos negócios.

No começo, a estrutura era modesta: uma funcionária e o apoio da família, que se reunia em mutirões para atender aos pedidos. Ana acumulava funções, da produção às degustações nos pontos de venda. “Fazia de tudo: testava receitas, embalava, negociava.”

A trajetória de crescimento foi marcada por decisões estratégicas. Ao fechar com outro varejista, o Grupo Mateus, a produção saltou de 200 para 600 quilos por mês, exigindo a ampliação da equipe e a realização de programas de capacitação da mão de obra, já que não havia formação específica para “biscoiteiros”.

Outra medida foi o registro do nome junto ao INPI, ainda nos primeiros anos. A decisão evitou um prejuízo significativo quando um conflito de nome com outro empreendimento levou a uma notificação com ameaça de multa de R$ 100 mil. “A marca já estava registrada e se manteve no mercado. Esse cuidado poupou tempo, dinheiro e desgaste”, explica.

Resiliência na pandemia e reestruturação

No entanto, como em toda jornada, outros desafios surgiram. Durante a pandemia, enfrentou dificuldades de distribuição. Foi o apoio de outras mulheres que ajudou a manter a empresa de pé e a acabar com o estoque. Após a crise, a empreendedora buscou novamente o Sebrae para elaborar um novo plano de negócios e mudou para um galpão maior. Atualmente, a companhia atua no varejo físico, mas um e-commerce voltado ao consumidor final está em desenvolvimento. Além disso, celebra a chegada de embalagens em lata com homenagens aos pontos turísticos do Maranhão.

A empresa também foca em ações sociais, como o reaproveitamento de materiais e a realização de campanhas contra a violência doméstica. Nas embalagens distribuídas em supermercados, por exemplo, estampa o número do Disque 180.

Do Maranhão para o mundo

A internacionalização aconteceu de forma natural. Ana foi convidada a integrar o PEIEX, programa da ApexBrasil que prepara companhias para exportação e, embora não tivesse esse objetivo em mente, aceitou o convite. “No início achei, até, que era um trote. Mas resolvi encarar o desafio para adquirir mais conhecimento”, conta. Após mais de um ano de capacitação, participou de uma feira no Paraguai, em 2019, e a boa recepção dos produtos motivou o início das tratativas com compradores estrangeiros. Em 2023, a marca começou a exportar para o México, após um processo de negociação e adequações sanitárias que durou mais de um ano.

O caso da Doce Pedaço mostra que, mesmo fora dos grandes centros, empreendimentos estruturados, com orientação técnica e planejamento, podem acessar mercados internacionais. “Nosso desafio agora é fortalecer a presença digital e vencer as barreiras logísticas da região”, afirma. Sem um porto operacional em São Luís, os envios internacionais precisam ser feitos por via aérea, o que encarece e limita o volume.

Apesar das dificuldades, segue confiante no caminho que escolheu. “Em alguns momentos achei que não daria certo, mas nunca desisti”, afirma. As incertezas vieram acompanhadas de descrença: no início, ouviu de muitas pessoas que era loucura não voltar ao mercado formal. “Foi difícil ir contra todos, mas eu queria mostrar que era possível.”

Para ela, tudo começa com a confiança no próprio trabalho. Depois, é fundamental buscar orientação séria, manter a qualidade dos produtos e estar aberta ao que surgir. “Nem tudo foi planejado, mas cada oportunidade é como um cavalo selado – não dá para deixar passar”, finaliza.

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