Caixa de som da JBL: produto está no churrasco, na praia e na casa dos brasileiros. Empresa tem 83% do mercado no Brasil (Harman/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 6 de outubro de 2025 às 06h58.
Tem quem ame — e tem quem entre em pânico ao ouvir a batida no último volume.
Fato é que, nos últimos anos, a caixinha de som da JBL virou um dos itens mais onipresentes do cotidiano brasileiro.
Seja na praia, no churrasco, no rolê de bike ou no porta-malas de um carro parado na esquina, o som da marca virou trilha sonora do Brasil urbano, periférico e pop. E, mais do que isso, virou um negócio gigante.
Segundo a consultoria GfK, a JBL detém 83% do mercado de caixas de som portáteis no Brasil.
O domínio é tão expressivo que transformou a operação nacional da Harman — dona da JBL e subsidiária da Samsung — em peça-chave da estratégia global. Mais do que isso: não tem nenhum mercado em que a JBL tenha tando market share como o Brasil.
Em 2024, a Harman faturou 56,5 bilhões de reais no mundo, e parte desse avanço veio da linha de áudio consumer (para consumidor final) — justamente o carro-chefe da operação brasileira.
No país, a empresa opera com duas fábricas: uma no Rio Grande do Sul, dedicada à produção de alto-falantes, e outra em Manaus, onde são montados os principais modelos da JBL, como a Boombox, uma caixa de som portátil de alta potência com alça e bateria reforçada; a PartyBox, linha de caixas grandes com luzes e visual de balada; além de equipamentos profissionais e sistemas multimídia para montadoras como a Toyota.
Agora, a operação local dá mais um passo: pela primeira vez, o Brasil vai produzir fones de ouvido da marca.
A nova linha, que entra em operação em 2025, será dedicada ao modelo Quantum 100 M2, fone de ouvido com fio da linha gamer da JBL, voltado para jogadores que buscam som mais preciso e microfone com cancelamento de ruído.
“É um segmento exigente, mas que nos deu escala para justificar a produção local”, afirma Rodrigo Kniest, presidente da Harman do Brasil, em entrevista à EXAME.
Segundo ele, a decisão exigirá expansão da fábrica, contratação de pessoal e homologações junto à Suframa. Manaus será a única unidade fora da China a produzir esses headphones da JBL.
A operação brasileira da Harman nasceu em 2010, com a compra da gaúcha Selenium, então uma tradicional fabricante de alto-falantes com sede em Nova Santa Rita, na região metropolitana de Porto Alegre.
Rodrigo Kniest, atual presidente, já era CEO da empresa na época.
“A Harman viu na Selenium um certificado de qualidade. Era como se dissessem: ‘vocês são tão bons que queremos comprar vocês’”, afirma.
Na época, a Selenium já exportava para mais de 70 países. A estrutura foi mantida, mas o desafio passou a ser integrar uma empresa familiar gaúcha a um conglomerado global.
“O principal trabalho foi preparar a equipe para essa transição de cultura. Depois, veio a adaptação tecnológica”, diz Kniest.
A mudança de marca foi feita aos poucos: os produtos passaram a estampar “Selenium by JBL” até que, anos depois, a sigla original foi retirada.
Outro ponto importante foi a negociação com a matriz para adaptar o portfólio global da JBL ao gosto local.
“Eles queriam que a gente vendesse qualquer coisa que já existia lá fora. Nós dissemos não. Precisamos testar, validar e ver se faz sentido para o Brasil”, lembra. A estratégia de moderação deu certo. “Evitamos lançar produto que não se encaixava no gosto, no bolso e no jeito de usar do brasileiro. Viramos case dentro da Harman.”
Essa autonomia levou o time brasileiro a criar produtos próprios.
Um deles foi o sistema de som para motos e bicicletas, desenvolvido para atender o comportamento do motoboy brasileiro e hoje exportado. Outro foi a linha PartyBox, de caixas grandes com luzes coloridas e som potente.
“A Harman dizia que aquilo não era produto para a JBL. Hoje, temos mais de 60% do market share global nesse segmento”, afirma o executivo.
O crescimento da marca no Brasil foi exponencial.
“No início era devagar, mas quando embalou, virou uma avalanche”, diz Kniest.
Hoje, a Harman tem mais de 15.000 pontos de venda no país, além de operar canais próprios de e-commerce e distribuição. “A JBL virou sinônimo de caixinha Bluetooth. Tem gente que nem fala o nome da categoria, só diz JBL.”
Esse domínio se reflete também na participação da operação brasileira dentro da estrutura global da Harman.
No segundo trimestre de 2025, a empresa teve receita global de 3,8 trilhões de wons, com alta de 12% sobre o trimestre anterior. Em 2024, o faturamento foi de 14,9 trilhões de wons, o equivalente a 56,5 bilhões de reais. Boa parte desse avanço veio do mercado de áudio consumer.
A fábrica de Manaus, que começou com 50 funcionários, hoje tem mais de 500.
É lá que são produzidos modelos como a Boombox 3, PartyBox Encore e, a partir de 2026, a Boombox 4 e os novos fones gamer Quantum. “Manaus virou nosso polo de flexibilidade e inovação. Ali conseguimos montar, adaptar e lançar produtos com agilidade e competitividade fiscal”, diz Kniest.
A escolha da capital amazonense como centro produtivo se justifica: por estar na Zona Franca, a Harman consegue oferecer preços mais acessíveis e competir com importados e piratas.
“Hoje conseguimos vender no Brasil por preços semelhantes aos dos EUA. Isso ajuda a combater o mercado ilegal e democratizar o acesso”, afirma.
Liderar o mercado, no entanto, tem seu custo. Um dos maiores desafios da Harman no Brasil é a pirataria.
“Somos constantemente copiados. Às vezes, inspiram-se demais”, diz o presidente. “É ruim, mas é melhor lidar com isso do que ter problema de vendas. É a dor da liderança.”
Além da falsificação, a empresa também enfrenta o chamado “descaminho” — a entrada ilegal de produtos originais no país sem o pagamento de impostos.
“Perde o consumidor, que compra um produto sem garantia, e perde a sociedade, que deixa de arrecadar”, afirma.
A Harman colabora com a Receita Federal, Polícia Federal e Procon para fiscalizar e coibir a prática.
Para continuar crescendo mesmo com 83% do market share, a estratégia agora é aumentar o acesso.
“O nosso consumidor começa com um modelo básico, depois quer outro para a piscina, outro para levar na bike, outro com mais potência. Ele começa a fazer coleção de JBL”, diz Kniest.
A empresa também trabalha para baratear as tecnologias premium e oferecê-las em linhas mais acessíveis.
A entrada na categoria de headphones produzidos no Brasil é parte dessa expansão.
“Vamos começar pelo gamer, que é um público exigente e que já nos deu volume. Mas queremos ampliar para outras linhas no futuro”, afirma. O investimento vai incluir aumento de turnos, ampliação fabril e homologação da nova linha junto à Suframa.
A meta é clara: manter o Brasil no centro do mapa da JBL global.
“Não somos só uma operação importante. Somos referência. Hoje, o nosso padrão de execução é copiado em outras regiões”, diz o CEO. “E estamos só começando.”