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Ele chefiou o marketing da Nike e construiu uma das marcas mais fortes do mundo. Aqui vão 6 lições

Greg Hoffman, ex-CMO da Nike, compartilha no South Summit Madrid os princípios que usou para transformar a marca em um fenômeno global

Greg Hofmann, ex-CMO da Nike: “Se todo mundo usa as mesmas ferramentas, tudo começa a parecer igual. Alguém precisa ter o olho, o gosto e a coragem de dizer: isso é a nossa cara, isso não é.” (Daniel Giussani/Exame)

Greg Hofmann, ex-CMO da Nike: “Se todo mundo usa as mesmas ferramentas, tudo começa a parecer igual. Alguém precisa ter o olho, o gosto e a coragem de dizer: isso é a nossa cara, isso não é.” (Daniel Giussani/Exame)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 5 de junho de 2025 às 06h02.

MADRI, ESPANHA* — Como transformar uma empresa de tênis em um símbolo global de aspiração e cultura? Greg Hoffman passou quase 30 anos respondendo a essa pergunta de dentro da Nike. Por ali, começou como estagiário e chegou ao cargo de chefe de marketing (CMO) global.

De lá, comandou campanhas que viralizaram, lançamentos que viraram ícones e produtos que redefiniram a relação entre esporte e estilo.

Hoje, ele lidera a consultoria Modern Arena e ensina marketing nos Estados Unidos.

No South Summit Madrid, evento de inovação correalizado pela IE University, Hoffman falou a um grupo de jornalistas, entre eles da EXAME, sobre como marcas podem continuar relevantes num mundo onde tudo parece igual, e por que a criatividade, longe de perder espaço com a IA, vai ser o diferencial mais importante do jogo.

A seguir, seis lições diretas de quem já viveu tudo isso por dentro.

1. Marcas não são feitas para contar histórias sobre si mesmas

Para Hoffman, o branding mais poderoso não fala sobre a marca em si — fala sobre quem o consumidor pode se tornar ao usá-la.

“Não se trata de como você quer que as pessoas se sintam sobre sua marca, mas como elas vão se sentir sobre si mesmas ao interagir com ela", diz.

Ele cita como exemplo campanhas da Nike que não tinham atletas famosos como protagonistas, mas pessoas comuns, convidadas a explorar seu próprio potencial. “Não vendíamos um tênis. Vendíamos a chance de jogar como Kobe Bryant”, disse no South Summit.

Essa abordagem, segundo ele, é o que separa uma campanha comum de uma narrativa memorável. A marca serve como espelho, não como vitrine. O consumidor precisa se ver ali, não apenas assistir de longe. E isso exige que as empresas deixem de falar apenas sobre performance e passem a comunicar propósito.

2. Storytelling começa com observação

“A maioria das marcas pula a parte mais importante: observar. Sem isso, não há insight, nem ponto de vista, nem campanha que se sustente.”

Hoffman defende uma estrutura simples, mas que raramente é seguida pelas empresas: observação, insight, ponto de vista e mídia.

Ele exemplificou com a campanha “Find Your Greatness”, lançada durante as Olimpíadas de Londres. A sacada criativa surgiu ao notar que havia 28 cidades chamadas London fora do Reino Unido. “Essa foi a chave para mostrar que a grandeza não é privilégio de quem está nos Jogos. Ela está em todo mundo.”

A partir dessa observação, a equipe construiu uma narrativa com propósito. O insight virou uma mensagem universal: todo mundo pode ser grandioso, não só os atletas de elite. Na prática, a campanha pegou esportistas de outras "Londres" fora do Reino Unido, e os colocou praticando esportes em suas Londres.

O ponto de vista foi o que deu alma à campanha, e a execução cuidou para que isso se traduzisse com autenticidade. Segundo Hoffman, marcas que não passam por essas etapas acabam criando “comunicação rápida e descartável”.

3. IA não elimina criatividade

“Se todo mundo usa as mesmas ferramentas, tudo começa a parecer igual. Alguém precisa ter o olho, o gosto e a coragem de dizer: isso é a nossa cara, isso não é.”

Para Hoffman, a inteligência artificial trouxe uma falsa sensação de vantagem competitiva.

Se todas as marcas têm acesso às mesmas ferramentas, o diferencial passa a ser quem sabe o que realmente representa a identidade da empresa. “É como reger uma orquestra. Os instrumentos são ótimos, mas sem um maestro, tudo soa igual.”

Nesse cenário, o diretor criativo ganha importância estratégica. Ele ou ela precisa ser o guardião do que é “on brand” e do que não é.

“As imagens estão começando a parecer as mesmas. Os slogans também. Isso acontece quando ninguém está no comando”, afirma. Para Hoffman, o papel de curadoria vai ser o que vai separar as marcas memoráveis das genéricas.

4. Não existe inovação sem cultura criativa

“Você precisa de pelo menos 5% de tempo e energia fora do plano. É ali que surgem as ideias que viram ícones.”

Durante sua passagem pela Nike, Hoffman incentivava o que chama de "espaço fora do plano".

Era uma margem, mesmo que pequena, onde as pessoas podiam perguntar “e se?” ou propor algo que não estava no roteiro. “Muitos dos nossos produtos e campanhas mais inovadores nasceram assim. Não foram planejados. Foram conversas de corredor, ideias noturnas, curiosidades fora da rotina.”

Essa margem de erro é, na verdade, um espaço para risco calculado.

Sem ela, as marcas se tornam previsíveis e, com o tempo, irrelevantes.

“Complacência é o inimigo da inovação”, diz Hoffman. “Quando você para de aprender, seu campo de visão encolhe.” Para ele, inovação real depende de uma cultura que permita errar para, eventualmente, acertar em cheio.

5. Marcas icônicas envolvem o consumidor na história

Hoffman vê uma mudança importante no branding atual: marcas não são mais narradoras exclusivas da sua própria história. Elas precisam dividir o palco com o público.

Ele cita o caso da Sephora, onde os clientes participam da criação de produtos, compartilham dicas e até definem como a marca se apresenta. “É quase uma democracia. O consumidor ajuda a escrever o roteiro.”

O mesmo vale para marcas como Harley-Davidson, que cultivam uma comunidade tão engajada que a identidade vai além do produto.

“Mesmo quem nunca subiu numa moto sabe o que a Harley representa”, diz.

Esse tipo de envolvimento emocional não se constrói com propaganda tradicional. É preciso criar oportunidades para que o público se veja como parte da construção da marca.

6. Empatia, curiosidade e coragem: os 3 pilares da liderança criativa

Hoffman resume sua filosofia de liderança em três palavras: empatia, curiosidade e coragem. Empatia significa entender a experiência real do consumidor — suas dores, aspirações e contexto de vida. “Na Nike, a gente precisava entender o atleta, não só os dados de performance. Era sobre viver o que eles viviam.”

Curiosidade, por sua vez, é a força que leva as marcas a buscar referências fora da bolha. Muitas inovações vêm de setores totalmente diferentes. Já a coragem é o que dá permissão para desafiar o status quo. “Você pode ter 95% da empresa rodando no plano. Mas precisa ter 5% onde as pessoas possam perguntar: e se a gente tentasse diferente?”

*A reportagem viajou a convite da IE University

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