Geyze Diniz: "Quero contribuir para o fortalecimento de uma mentalidade de impacto entre investidores, mostrando que retorno financeiro e transformação social não são agendas incompatíveis" (Divulgação/Divulgação)
Estímulo
Publicado em 19 de setembro de 2025 às 10h27.
Última atualização em 19 de setembro de 2025 às 10h33.
Sensível com situações de vulnerabilidade, a economista Geyze Diniz cofundou e preside o Conselho do Pacto Contra a Fome, liderando um movimento que pretende acabar com a fome no Brasil até 2030, meta estabelecida pela ONU (Organização das Nações Unidas).
A executiva, que também participa como conselheira da Península Participações, agora passa a integrar uma das cadeiras do conselho do Fundo de Impacto Estímulo. Trata-se de uma iniciativa que nasceu na pandemia para apoiar o micro e pequeno empreendedor brasileiro. Foi encabeçada por Eduardo Mufarej, e teve apoio de Abilio Diniz para se tornar realidade.
Após cinco anos, o fundo já passa de R$360 milhões em apoio financeiro para 6 mil pequenos negócios de todo país, sendo 91% deles em regiões de baixa renda e 54% com mulheres em seu quadro societário. Destes, 36% tiveram acesso a crédito pela primeira vez. São 60 mil empregos impactados.
Com base no conceito de Blended Finance (financiamento misto), que une doações e investimentos de impacto de diferentes tipos de capitais, sejam eles públicos, privados ou filantrópicos, o Estímulo conta ainda com mais duas mulheres no grupo, representando agora 42% de liderança feminina.
São elas: Natalia Dias (BNDES, Cebri, Standard Bank Group, Cibrasec e ING) e Marta Pinheiro (XP Inc, Integration Consulting e IDIS).
As quatro posições restantes estão ocupadas por Eduardo Mufarej, que preside o conselho, além de Azor Barros, Carlos Fonseca e Pedro Faria. Na liderança executiva, Lucas Conrado e Vinícius Poit seguem à frente da organização, consolidando a visão de futuro do Estímulo.
A seguir, ela conta mais sobre os planos que sua visão para ajudar a iniciativa incentivada por Abilio, que sempre acreditou no poder do empreendedorismo para transformar o país.
Dentro de tantas atuações, agora você conta com mais um papel de relevância para causar impacto econômico no Brasil. Quais foram os pontos essenciais que a fizeram aceitar o ingresso no conselho do Estímulo?
Aceitar o convite para integrar o conselho do Estímulo foi uma decisão natural diante da convergência de propósitos. Acredito profundamente no papel do setor privado no enfrentamento das desigualdades do país, e o Estímulo é um exemplo vivo de como o capital pode ser mobilizado com responsabilidade social para gerar impacto real na ponta.
O trabalho que desenvolvemos no Pacto Contra a Fome já demonstrou que não há transformação sustentável sem articulação entre diferentes setores da sociedade. O Estímulo representa justamente essa intersecção entre inovação econômica e compromisso social, e isso me motivou a somar forças.
Falar do papel do empreendedorismo brasileiro é reconhecer sua potência transformadora: é por meio dele que se geram empregos, se movimenta a economia local e se criam soluções criativas e resilientes para os desafios do país. Acredito firmemente que apoiar e fortalecer o empreendedorismo é investir no desenvolvimento do Brasil — com mais equidade, inclusão e futuro.
Dentro das discussões, o seu papel terá mais força em quais frentes para impulsionar o fundo de impacto?
Minha contribuição se dará especialmente na articulação de redes e na mobilização social e institucional. Tenho atuado com intensidade para promover alianças entre setor privado, sociedade civil e poder público, e acredito que essa experiência será fundamental para ampliar a capilaridade do Estímulo e gerar escala no apoio a pequenos negócios.
Também quero contribuir para o fortalecimento de uma mentalidade de impacto entre investidores, mostrando que retorno financeiro e transformação social não são agendas incompatíveis. Pelo contrário, se fortalecem mutuamente.
Como você acredita que a representatividade feminina pode ajudar nas decisões estratégicas do conselho? Quais as visões mais relevantes a agregar nesse sentido?
A presença de mulheres em espaços estratégicos muda a qualidade do debate. Somos educadas para pensar de forma integradora, para enxergar o todo e agir com empatia, características fundamentais quando se trata de impacto social.
Além disso, há uma sensibilidade natural para identificar desigualdades, inclusive aquelas mais sutis, que muitas vezes passam despercebidas em conselhos tradicionalmente masculinos. A diversidade de gênero é uma força estratégica: amplia o repertório, fortalece a governança e torna as decisões mais aderentes à realidade de um país tão plural quanto o Brasil.
Como cofundadora e presidente do Conselho do Pacto Contra a Fome, que pretende acabar com a fome no Brasil até 2030 e garantir que todos os brasileiros estejam bem alimentados em 2040, vemos a força do trabalho social em seu dia a dia. Como é a expectativa agora de olhar para os micros e pequenos empreendedores prosperarem seus negócios de maneira justa e cabível no cenário brasileiro?
A luta contra a fome está diretamente ligada à promoção de uma economia mais inclusiva. Micro e pequenos empreendedores são o coração da economia brasileira, especialmente nas periferias e nos territórios mais vulneráveis. Empoderar essas pessoas com acesso a crédito, capacitação e redes de apoio é também uma estratégia de combate à pobreza e à insegurança alimentar. A prosperidade desses negócios precisa ser justa, sustentável e enraizada em políticas de fomento adequadas à realidade brasileira e o Estímulo tem um papel central nesse processo.
Com a moeda em desvalorização no Brasil, instabilidade fiscal e dólar alto, está cada vez mais difícil convencer o mercado financeiro a abraçar o risco de novas iniciativas. Como você enxerga que a estrutura de blended finance pode contribuir dentro deste cenário?
O blended finance é uma ferramenta poderosa justamente porque compartilha riscos e amplia o apetite de investidores privados para iniciativas com forte potencial de impacto. Ele funciona como um mecanismo de confiança: ao contar com a participação de capital filantrópico ou público, destrava o interesse de fundos privados que, sozinhos, talvez não apostassem em projetos com retorno de médio ou longo prazo.
Diante do atual cenário econômico, essa é uma estratégia pragmática e eficaz para destravar investimentos em áreas críticas para o país, como o apoio a pequenos empreendedores.
Você enxerga o blended finance como uma modalidade a se popularizar entre pessoas comuns, ou ainda deve permanecer restrito ao radar de grandes companhias que já se comprometem com o ambiente ou retornos sociais?
O blended finance ainda é um conceito distante para a maioria das pessoas, mas acredito que ele tem potencial para se tornar mais acessível e compreensível com o tempo, principalmente se vier acompanhado de instrumentos educacionais e exemplos bem-sucedidos.
Hoje, ele ainda está mais restrito às grandes corporações e investidores institucionais, mas à medida que o mercado de impacto amadurece e que o cidadão comum passa a exigir mais responsabilidade social de onde investe, essa lógica pode se expandir. O importante é construir pontes entre o capital e o impacto e torná-las cada vez mais democráticas.
Olhando para o futuro, que oportunidades você prevê à medida que o blended finance avança no Brasil?
Vejo um campo fértil de oportunidades. O Brasil tem um ecossistema social vibrante, mas ainda subfinanciado. À medida que o blended finance se consolida, poderemos ver o nascimento de novos fundos híbridos, a mobilização de doações estratégicas para alavancar investimento privado e o fortalecimento de modelos de negócio orientados à solução de problemas sociais e ambientais.
Isso pode acelerar transformações profundas em áreas como educação, saúde, agricultura sustentável e segurança alimentar. O futuro do investimento de impacto no Brasil passa, sem dúvida, por essa inovação financeira e cabe a nós garantirmos que ele seja justo, inclusivo e transformador.