Dennis Hong, professor de engenharia e criador de 60 robôs: “Eu quero que robôs vivam comigo. Que lavem a louça, que levem o lixo para fora. E para isso, eles precisam ter o formato de um ser humano” (South Summit/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 5 de junho de 2025 às 09h11.
Última atualização em 5 de junho de 2025 às 15h49.
MADRI, ESPANHA* -- O que parecia ficção científica nos anos 1980 está começando a ganhar forma nos laboratórios de engenharia.
Em 2025, os robôs já andam sozinhos, sobem escadas, jogam futebol e até encaram terrenos irregulares. tudo isso sem um humano no controle. A próxima fronteira é fazer essas máquinas funcionarem dentro de casa, como assistentes multifuncionais.
Por trás dessa corrida está Dennis Hong, professor da Universidade da Califórnia em Los Angeles e fundador do laboratório RoMeLa, especializado em robôs com locomoção avançada.
Ele já criou mais de 60 modelos diferentes — de máquinas para resgates a robôs infláveis que dançam.
Por isso, foi apelidado pelo jornal Washington Post de “o Leonardo da Vinci dos robôs”.
A presença de Hong no South Summit Madrid 2025 destacou um ponto central no debate sobre robótica neste ano: os robôs estão deixando de ser peças de demonstração técnica para se tornarem parte do cotidiano. A inteligência artificial acelerou esse processo, permitindo que eles aprendam, reajam e se adaptem a ambientes reais — inclusive os imprevisíveis.
É também um momento simbólico para ele.
Seu robô mais recente, chamado Artemis, venceu a edição 2024 da Robocup, torneio internacional de futebol entre robôs autônomos. Em 2025, a competição será no Brasil. “Estamos desenvolvendo uma nova geração de robôs mais rápidos, mais estáveis e mais inteligentes para competir aí. Mantenham suas expectativas altas”, afirmou no evento.
Mas, para além do espetáculo, Hong tem uma ambição doméstica: “Eu quero que robôs vivam comigo. Que lavem a louça, que levem o lixo para fora. E para isso, eles precisam ter o formato de um ser humano”, diz.
Durante a apresentação, Hong explicou por que insiste em construir robôs com forma humana — mesmo sabendo que isso é muito mais difícil do que criar máquinas com funções específicas.
Segundo ele, o mundo foi projetado para corpos humanos.
“Escadas têm uma altura específica para nossos passos. As maçanetas foram feitas para mãos humanas. A única forma de um robô navegar nesse ambiente sem adaptações é sendo do nosso tamanho e formato”, diz.
Isso não significa que todos os robôs precisam ter braços e pernas. O aspirador de pó autônomo, por exemplo, se parece mais com um disco de hóquei do que com um faxineiro — porque essa é a forma ideal para a função. “Se o robô só tem que fazer uma coisa, ele pode ter qualquer forma. Mas, se for multitarefa, precisa ser como a gente”, afirma.
É nesse raciocínio que nasceu o Artemis, robô com dois braços, duas pernas, tronco e cabeça, desenvolvido para se locomover de forma autônoma em ambientes reais.
Artemis é a sigla para Advanced Robotics Technology with Enhanced Mobility and Stability, ou “Tecnologia Robótica Avançada com Mobilidade Aprimorada e Estabilidade Melhorada”.
“O verdadeiro teste de um robô é colocá-lo fora do laboratório”, diz Hong. “No nosso campus, levamos o Artemis pra rua a cada duas semanas. Empurramos, chutamos, jogamos coisas nele. E ele se mantém de pé. Isso é muito difícil de fazer.”
Hong surpreendeu a plateia ao dizer que o Artemis, seu robô mais avançado, não usa IA para se movimentar. O controle dos movimentos é feito por meio de modelos matemáticos baseados nas leis da física.
“Para a locomoção, usamos métodos tradicionais. Sabemos como funciona o impacto, a aceleração, a fricção, e aplicamos essas equações. Isso é engenharia clássica, não inteligência artificial”, diz.
A IA entra em outros pontos, como a visão do robô e o planejamento de trajetórias.
Mas a movimentação é programada com base em modelos. E o motivo é simples: não há dados suficientes para treinar um robô a andar sozinho usando apenas IA.
“Você precisa de dados. E onde estão os dados de impacto e torque de um robô caminhando? Eles não existem. Você não encontra isso no Google”, diz.
Por outro lado, em robôs menos previsíveis, a IA se torna a única saída. Um exemplo é o Baloo, robô inflável com pernas, feito de hélio, criado por Hong. Ele é leve, anda com suavidade e consegue até subir escadas — mas não pode ser controlado com equações tradicionais.
“Com o Baloo, usar física seria impossível. O comportamento dele muda com o vento. É um sistema altamente não linear. Então, deixamos ele andar 24 horas por dia em nosso laboratório, captamos os movimentos e usamos isso pra treinar a IA”, diz.
Nesse caso, é o aprendizado de máquina que ensina o robô a se mover.
Para Hong, o mais importante é usar a ferramenta certa. “Se você tem um martelo, tudo parece prego. E hoje, muita gente acha que a IA é a resposta para tudo. Não é. Você precisa entender o problema antes de escolher a tecnologia.”
Na parte final da apresentação, Hong mostrou experimentos com novos robôs — alguns que flutuam, outros que andam sobre a água, e até um que dança no ritmo da música. Um deles, o Bumble, é um robô que usa bolas de pingue-pongue nos pés para atravessar superfícies líquidas. “Ele literalmente anda sobre a água. É leve o suficiente para não afundar”, afirma.
Mas não é só performance.
O laboratório agora está testando duas abordagens simultâneas para controle dos robôs: uma equipe usa modelos matemáticos tradicionais; a outra, aprendizado por reforço, um tipo de IA onde o robô aprende por tentativa e erro, em simulações e no mundo real.
“Construímos dois robôs idênticos. Um usa IA. O outro, física clássica. A ideia é comparar. Ver qual resolve melhor o mesmo problema”, diz. O objetivo é simples: usar a ferramenta certa, não a mais popular.
Para ele, o futuro da robótica passa por mais do que avanços técnicos. É também uma questão de aceitação cultural.
“Se queremos que robôs estejam ao nosso lado, eles precisam funcionar bem, mas também precisam se mover como nós, viver nos nossos espaços", diz.
*O repórter viajou a convite da IE University