Bernardo Gomes, sócio e fundador da Bright Brains: empreendedor teve a ideia após ser diagnosticado com doença rara
Repórter
Publicado em 1 de julho de 2025 às 05h54.
Última atualização em 1 de julho de 2025 às 09h36.
A segunda jornada empreendedora do paulista Bernardo Gomes começou no momento em que ele mais precisava desacelerar. Diagnosticado com Machado-Joseph, uma doença degenerativa rara que afeta o equilíbrio e a coordenação motora, ele passou por diversos tratamentos até encontrar na neuromodulação não invasiva uma forma de amenizar os sintomas e ganhar tempo contra o avanço da condição.
Foi aí que surgiu a Bright Brains, clínica que ele define como uma combinação entre ciência, inteligência artificial e personalização. Com a primeira unidade inaugurada em abril de 2025, na Vila Olímpia, a Bright Brains nasce com uma proposta ousada: oferecer protocolos individualizados de neuromodulação para tratar transtornos mentais e aumentar a performance cognitiva.
A neuromodulação não é nova. Já está presente na medicina europeia há mais de três décadas e é usada para tratar condições como depressão, ansiedade, insônia, dores crônicas, sequelas de AVC e até sintomas do espectro autista. No Brasil, porém, ainda é vista como uma técnica experimental — pouco difundida nos cursos de medicina e aplicada por clínicas com infraestrutura limitada.
A Bright Brains quer mudar isso. A proposta é transformar um tratamento de nicho em um modelo escalável, profissionalizado e orientado por dados. Com o uso de inteligência artificial, a empresa coleta dados clínicos, aplica testes cognitivos e sugere um plano de tratamento validado por um comitê médico. Os estímulos cerebrais são aplicados por equipamentos que enviam pulsos magnéticos ou elétricos, dependendo do objetivo: ativar ou inibir áreas específicas do cérebro.
Para além do universo clínico, a startup já mira um mercado adjacente: o da alta performance cognitiva, voltado para executivos, atletas e profissionais que buscam aprimorar foco, produtividade e criatividade.
A neuromodulação atua diretamente no sistema nervoso, utilizando estímulos como correntes elétricas ou pulsos magnéticos para regular a atividade neural. É como se fosse um semáforo cerebral, onde os sinais elétricos (que seriam os carros) são melhor direcionados para melhorar o funcionamento das "vias neurais" (os neurônios). Essa técnica pode ser realizada de forma não invasiva, com a aplicação de estímulos diretamente no couro cabeludo, ou de maneira mais invasiva, com implantes cirúrgicos.
Na sala de tratamento da Bright Brains, o paciente se deita confortavelmente enquanto os profissionais aplicam os estímulos. Usando um equipamento certificado, como o de estimulação magnética transcraniana (TMS), que envolve uma bobina colocada na cabeça, a máquina envia pulsos magnéticos direcionados a áreas específicas do cérebro para modular sua atividade. O processo, que dura entre 20 e 30 minutos, é indolor e não exige tempo de recuperação.
Apesar de ser cientificamente comprovada e aprovada por órgãos regulatórios como a FDA nos Estados Unidos e a Anvisa no Brasil, a neuromodulação ainda não é amplamente difundida entre os médicos e fisioterapeutas, principalmente no Brasil. Um dos principais motivos é que a técnica não faz parte do currículo acadêmico da maioria das faculdades de medicina, fisioterapia e outros cursos de saúde. Portanto, muitos profissionais saem das universidades sem conhecimento sobre a tecnologia ou com uma compreensão limitada de como ela pode ser aplicada no tratamento de condições neurológicas e psiquiátricas.
Outro fator que limita a popularização é o custo dos equipamentos necessários para a aplicação da neuromodulação, que podem variar de R$ 5 mil (para equipamentos mais simples) a até R$ 250 mil para os mais avançados.
Bernardo não está sozinho no projeto. Ao lado dele estão Ricardo Galhardoni, referência em neuromodulação na América Latina, e Fernando Pereira, investidor com trajetória no setor de saúde. O trio une vivência acadêmica, expertise médica e experiência de mercado.
A ideia, segundo Bernardo, é aplicar à Bright Brains a mesma lógica de escala e profissionalização que usou na construção da Sinqia. A empresa de tecnologia para o setor financeiro abriu capital na B3, fez 24 aquisições e foi vendida por R$ 2,5 bilhões para a Evertec em 2023.
“Eu vi que, apesar da eficácia da neuromodulação, o tratamento ainda é desconhecido no Brasil. Isso acontece porque os médicos não aprendem sobre ela nas faculdades e os fabricantes não educam o mercado. Lá fora, há grandes redes clínicas. Aqui, ainda estamos no começo”, explica o executivo.
De acordo com o Ministério da Previdência Social, o Brasil bateu recorde de afastamentos por transtornos como ansiedade e depressão: foram quase 500 mil casos em 2024. A Organização Mundial da Saúde aponta o país como líder global em diagnósticos de ansiedade.
A Bright Brains pretende ocupar esse vácuo entre a demanda crescente e a escassez de soluções alternativas à medicação. O ticket médio para um ciclo de indução gira em torno de R$ 20 mil a R$ 30 mil, com pacotes promocionais de entrada para novos pacientes. A empresa ainda não aceita planos de saúde, mas planeja oferecer certificações para que profissionais credenciados apliquem os protocolos de forma padronizada em outras regiões.
A meta é abrir 20 novas unidades nos próximos anos, com foco inicial no interior de São Paulo e em algumas capitais brasileiras. Até agora, o investimento é 100% próprio, mas a empresa planeja captar recursos para financiar a expansão.