Lilian Parola, diretora de mercado de capitais e tesouraria da SumUp nas Américas: "A antecipação instantânea virou padrão. O cliente nem quer saber de esperar até o dia seguinte mais” (Sumup/Divulgação)
Repórter de Negócios
Publicado em 10 de novembro de 2025 às 14h19.
As micro e pequenas empresas talvez sejam as que mais sintam na pele os efeitos dos juros altos no Brasil.
Com margens apertadas e pouca estrutura de gestão, muitas dependem da antecipação de vendas parceladas no cartão para manter o caixa funcionando.
É nesse cenário que a SumUp, fintech global de pagamentos, acaba de anunciar a maior captação de sua história no país: 850 milhões de reais via dois novos FIDCs, os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios.
Nessa modalidade, investidores aplicam recursos em carteiras formadas por recebíveis — ou seja, créditos que uma empresa tem a receber, como vendas parceladas no cartão. A empresa antecipa esse dinheiro aos clientes, e o investidor recebe o pagamento ao longo do tempo, com remuneração atrelada ao risco e aos prazos dos recebíveis.
O dinheiro será usado para reforçar a oferta de antecipação de recebíveis aos clientes da base — formada majoritariamente por empreendedores individuais, MEIs e donos de pequenos comércios.
A operação chega num momento em que a empresa vê crescer a demanda por liquidez imediata. E marca também um novo patamar na estratégia de funding da fintech no Brasil.
“O nosso cliente precisa vender hoje e receber agora. Às vezes em 30 minutos. E a gente precisa estar pronto para isso”, afirma Lilian Parola, diretora de mercado de capitais e tesouraria da SumUp na América Latina.
A empresa planeja usar os recursos para ampliar o alcance do pagamento instantâneo das vendas — uma modalidade cada vez mais exigida pelos clientes da base.
A nova captação de 850 milhões de reais foi dividida em dois fundos: 450 milhões no FIDC SumUp Smart I e 400 milhões no FIDC SumUp Smart II, ambos estruturados com base em recebíveis de cartão de crédito.
A segmentação em dois fundos tem um motivo: separar os tipos de risco aceitos por cada grupo de investidores.
“Alguns investidores preferem exposição apenas a bancos S1, os seis maiores do país. Outros aceitam bancos de menor porte. Quando a gente mistura isso num fundo só, complica a precificação e a avaliação de risco”, afirma Lilian.
O movimento também é uma resposta à experiência adquirida nos últimos anos.
A SumUp começou a atuar como adquirente própria em 2021, após deixar de operar como subadquirente da Cielo.
Desde então, tem avançado em captações via mercado de capitais — e, com isso, reduzido a dependência de grandes adquirentes para antecipar os pagamentos aos clientes.
“A gente aprendeu na pandemia que não dá para depender de uma única fonte. Hoje temos uma base ampla de contrapartes e diversas formas de funding”, diz Lilian.
Segundo a executiva, a estrutura com FIDCs traz vantagens: prazo fechado, previsibilidade de custo e acesso a uma base mais ampla de investidores. O desafio, claro, é o custo. “É uma fonte um pouco mais cara, mas traz estabilidade e diversificação. A gente busca equilíbrio”, afirma.
A antecipação de recebíveis não é uma novidade para a SumUp.
Desde os primeiros anos de operação no Brasil, a fintech oferece a opção de antecipar vendas parceladas — uma demanda estrutural dos pequenos negócios brasileiros.
Mas o modelo evoluiu. O que antes era uma antecipação no dia seguinte, virou pagamento instantâneo, muitas vezes em poucos minutos. “Hoje, mais de 90% dos nossos clientes optam pela antecipação instantânea, inclusive nos fins de semana. Eles vendem e recebem em até 30 minutos na conta digital da SumUp”, diz Lilian.
A adesão ao modelo está diretamente ligada à necessidade urgente de caixa. Segundo a executiva, o microempreendedor precisa do dinheiro com rapidez para manter o ciclo do negócio rodando. “Ele vende agora e já precisa comprar os ingredientes para o dia seguinte. Então a exigência por liquidez aumentou, e a gente precisou se adaptar.”
Para garantir esse tipo de repasse imediato, a empresa precisa ter caixa constante, mesmo sabendo que o dinheiro dos cartões só será liquidado semanas depois. Daí a importância dos fundos e da estratégia de funding diversificada.
“É por isso que esse dinheiro que a gente capta é tão estratégico. A antecipação instantânea virou padrão. O cliente nem quer saber de esperar até o dia seguinte mais”, afirma Lilian.
A SumUp tem hoje cerca de 4 milhões de clientes no mundo e mantém foco prioritário em micro e pequenos negócios, principalmente no Brasil, onde opera desde 2013. Mas mesmo com a digitalização crescente, boa parte dessa base ainda lida com dificuldades operacionais básicas.
“Fizemos uma pesquisa recente que mostra que 43% dos nossos clientes ainda fazem a gestão financeira no papel. E 9% não fazem gestão nenhuma”, afirma Lilian.
Esse dado, segundo ela, escancara a urgência por soluções que vão além do meio de pagamento. “Nosso papel não é só ajudar o cliente a receber. É também dar as ferramentas para que ele consiga cuidar do negócio”, afirma.
A SumUp atua hoje em 37 países — com presença forte na Europa e em crescimento na América Latina. Dentro desse mapa, o Brasil já figura entre os cinco maiores mercados do mundo para a empresa.
“O Brasil tem um sistema financeiro sofisticado e consumidores que adotam rápido novas tecnologias. Isso faz com que a gente funcione como um laboratório para o resto do mundo”, diz Lilian.
Mais do que isso: o time local da SumUp lidera a gestão financeira de toda a operação nas Américas, incluindo países como México, Colômbia, Chile, Peru e até os Estados Unidos.
“Toda a tesouraria da América Latina e parte dos Estados Unidos é gerida a partir do Brasil. Isso mostra a relevância do país para a empresa globalmente”, afirma a executiva.
A expectativa é que o mercado brasileiro siga como prioridade, tanto na oferta de crédito quanto no desenvolvimento de novos produtos voltados para a base empreendedora.