Agência
Publicado em 22 de julho de 2025 às 14h56.
Aos 50 anos, a Hello Kitty, personagem japonesa criada em 1974 pela empresa Sanrio, voltou a ocupar espaço nas redes sociais chinesas, não mais como um ícone infantil, mas como um símbolo do cansaço emocional da Geração Z.
Vídeos no Douyin, versão chinesa do TikTok, mostram a personagem soterrada por papéis, presa em escritórios sem janelas e cercada por frases de autoajuda. O que antes era símbolo de inocência se transformou em um canal para ironia, sátira e, principalmente, nostalgia.
Desde o início de 2024, a personagem tem sido usada em colaborações com marcas, exposições e criações geradas por inteligência artificial. Usuários chineses misturam a Hello Kitty com estética Y2K, estilo que resgata referências do final dos anos 1990 e início dos 2000, roupas de streetwear e elementos da vida corporativa. O conteúdo viralizado nas redes sociais explora temas como o esgotamento profissional e a crítica à cultura do trabalho excessivo, o chamado "996", jornada que vai das 9h às 21h, seis dias por semana.
Em resposta à insegurança econômica e à alta competitividade, os jovens chineses têm buscado conforto emocional no consumo de produtos que remetem à infância. Pesquisa da consultoria Hub of China indica que quase 70% da Geração Z chinesa faz ao menos uma compra emocional por mês, adquirindo itens como doces, pelúcias e brinquedos, não pela utilidade, mas pelo valor afetivo.
Marcas locais também exploram essa tendência. A White Rabbit, conhecida pelas balas tradicionais, relançou embalagens retrô e ampliou sua linha com velas e perfumes inspirados em seus sabores. No fim de 2024, o Universal Beijing Resort lançou caixas surpresa com pelúcias de Minions inspiradas nos animais do zodíaco chinês, vendidas a 99 yuans (cerca de US$13,50), que esgotaram rapidamente.
Uma pesquisa de 2024 conduzida pelo Instituto de Desenvolvimento Fudan aponta que os consumidores jovens chineses estão mudando seu foco de bens duráveis caros para produtos que trazem satisfação emocional imediata, como alimentos e entretenimento. Esse comportamento indica uma mudança no padrão tradicional de aspiração de consumo, que antes valorizava a ascensão econômica.
O avanço desse consumo de natureza afetiva aponta para um deslocamento no que tradicionalmente se entende como aspiração de consumo na China. Se antes o desejo de ascensão econômica guiava as decisões de compra, hoje cresce a busca por estabilidade emocional. Esse movimento, que pode parecer pontual ou individual, é, na verdade uma resposta coletiva a um ambiente social de alta pressão e competição.
E no mercado chinês, onde marcas locais e internacionais disputam atenção com intensidade, compreender essa nuance se tornou mais do que uma vantagem, mas uma exigência estratégica.